A gestação é caracterizada por
ajustes fisiológicos e anatômicos que provocam mudanças importantes no
organismo materno, incluindo os elementos do sangue circulante e o processo de
expansão do volume plasmático com consequente hemodiluição¹. O
útero sofre modificações de hipertrofia e dilatação, requerendo aumento da
vascularização pela necessidade de maior perfusão sanguínea, enquanto que na
placenta, devido ao aumento progressivo, ocorre incremento correlato do fluxo
sanguíneo uteroplacentário com a evolução da gestação, o que demanda, também,
aumento no número de vasos sanguíneos².
Nesta fase gestacional, se o suprimento de ferro não for adequado
poderá ocorrer o desenvolvimento de anemia ferropriva, que é definida como a
condição que resulta da inabilidade do tecido eritropoiético de manter a
concentração normal de hemoglobina devido ao inadequado suprimento de ferro,
sendo que, World Health Organization (WHO) estabelece o limite de 11,0
g/dL, abaixo do qual se define a anemia na gestação². Além da hemoglobina como
marcador da anemia na gestação, tem-se o hematócrito como indicador, quando
seus valores são
inferiores a 33%. Assim, tanto hemoglobina quanto
hematócrito são usados com frequência como teste de triagem e confirmação de
diagnóstico de anemia¹. No quadro 1, retirado do artigo “Prevalência de anemia e
deficiência de ferro: relação com índice de massa corporal em gestantes do
Centro-Oeste do Brasil”, estão
expressos os valores de referência desses indicadores para diagnóstico de
alteração da condição nutricional.
Quadro 1. Valores de referência e
classificação dos índices hematológicos.
Retirado do artigo “Prevalência de anemia e deficiência de ferro:
relação com índice de massa corporal em gestantes do Centro-Oeste do Brasil”.
Índices hematológicos
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Método de análise
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Limites para diagnóstico de alteração
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Classificação da condição nutricional
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Hemoglobina (Hb)
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Espectrofotometria com equipamento Pentra 80 Marca ABX, (Paris França)
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Abaixo de 11g∕dl
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Anemia
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Hematócrito (Hct)
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Método de integração numérica do volume corpuscular médio (VCM)
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Abaixo de 33%
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Anemia
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Existem duas formas
químicas do ferro nos alimentos: o ferro heme e não-heme. O primeiro
encontra-se na estrutura do anel porfirina, ligado à hemoglobina e mioglobina,
representando cerca de 40% do ferro do tecido animal. Sua absorção é elevada e
não é influenciada pelos fatores antinutricionais. As formas inorgânicas ou
ferro não-heme estão presentes tanto em tecidos animais como em todos os
vegetais que contêm ferro; porém, são de baixa biodisponibilidade.³
A absorção do ferro se dá
do seguinte modo: o ferro absorvido no trato gastrointestinal se liga a uma
glicoproteína: a transferrina. Ligado a esta proteína, o ferro circula pelo
organismo. Na superfície das células, o ferro liga-se a receptores específicos.
O complexo transferrina-ferro ligado a receptores penetra na célula. A
transferrina libera o ferro deixando a outra parte (apotransferrina) voltar à
superfície celular, retornando em seguida à circulação, continuando então o seu
ciclo³.
A deficiência de ferro durante a gestação tem sido relacionada ao
aumento da morbidade e mortalidade de gestantes e do feto. A relação entre
anemia da gestante e risco de nascimento de crianças prematuras parece
específica da anemia por deficiência de ferro².
Alimentos fortificados com ferro apresentam-se como a opção mais
interessante para grupos populacionais específicos, como gestantes,
constituindo-se numa medida de alta efetividade e flexibilidade, rápida
aplicação e socialmente aceita, por não demandar mudanças na rotina alimentar
dos indivíduos².
Com o programa de fortificação de farinhas (a fortificação das
farinhas de trigo e de milho com ferro e ácido fólico é obrigatória no Brasil
desde 2004) acoplado ao programa de suplementação de ferro para gestantes e
lactantes (instituído pela Portaria nº 730/GM em 13 de maio de 2005), cuja demanda específica não seria
atendida exclusivamente com o ferro dietético, a perspectiva de controle da
anemia é promissora².
Diante da importância do suprimento de ferro durante a gestação, é
realmente imprescindível que haja uma preocupação social em se garantir que
todas as gestantes possam adquirir ferro pela alimentação. Afinal, mantendo-se
níveis adequados de ferro no organismo, afasta-se uma doença que compromete o
desenvolvimento do feto, mas que é relativamente bastante prevenível.
Referências:
1. CAMARGO, R.M.S. et al. Prevalência de anemia e deficiência de ferro: relação com índice de
massa corporal em gestantes do Centro-Oeste do Brasil. Medicina. Ribeirão Preto, 2013. 46(2): 118-27.
2.
NEME, L.C.L.H. et al. Estado nutricional,
consumo de ferro e vitamina C e níveis sanguíneos de hemoglobina de gestantes:
estado nutricional e hemoglobina de gestantes. Cadernos da Escola de Saúde, Curitiba, 4: 149-164
vol.1.
3. MOURA, N.C.;
CANNIATTI-BRAZACA, S.G. Avaliação da
disponibilidade de ferro de feijão comum (Phaseolus
vulgaris L.) em comparação com carne bovina. Ciênc. Tecnol. Aliment., Campinas, 26(2): 270-276, abr.-jun. 2006.