segunda-feira, 15 de julho de 2013

Algumas desordens do metabolismo de aminoácidos e intermediários do ciclo da ureia

Desordens manifestadas nos primeiros anos de vida

Fenilcetonúria
A fenilcetonúria é manifestada precocemente e é uma doença relacionada com os erros congênitos do metabolismo de aminoácidos, caracterizando-se pela deficiência da enzima fenilalanina-hidroxilase, que catalisa a conversão de fenilalanina em tirosina, causando o acúmulo da fenilalanina e de seus derivados no organismo. Esta doença pode causar complicações neurológicas, sendo o retardo mental a manifestação mais grave, além de eczema, e deficiência na pigmentação dos cabelos e da pele. A fenilcetonúria ocorre em todas as etnias, com incidência em recém-nascidos podendo variar de 1:2.600 a 1:26.000, sendo que no Brasil a incidência média é de 1:10.000 recém-nascidos. O diagnóstico da fenilcetonúria é feito através de exames laboratoriais, como o teste de Guthrie-BIA e o de McCaman e Robins efetuados num período de 24 horas até sete dias após o parto. Quando diagnosticado, o recém-nascido é submetido a uma dieta hipoproteica com restrição de fenilalanina, visando impedir a manifestação dos sintomas da doença.

Acidúria glutárica do tipo I
A acidúria glutárica do tipo I também tem manifestações nas primeiras fases da vida, tipicamente em crianças, e na frequência de 1:30.000 indivíduos, especialmente nos sul africanos negros. Essa doença é autossômica recessiva e é caracterizada por uma deficiência na enzima multifuncional glutaril-CoA-oxidase, que participa da oxidação do glutaril-CoA para a formação de crotonil-CoA, impossibilitando a degradação da lisina e do triptofano na mitocôndria do indivíduo acometido. A variabilidade de sintomas relacionados com a acidúria glutárica do tipo I é atribuída a fatores epigenéticos e ao meio ambiente, e a relação entre o grau de deficiência da enzima e o quadro clínico ainda é desconhecida. Alguns casos foram relatados clinicamente e, dentre eles, cita-se o de Knerr et al. que reportaram o estudo de três crianças afetadas e que apresentavam altos níveis de ácido glutárico na urina, e o de Casella et al. que avaliaram seis pacientes diagnosticados com a doença, todos com macrocrania devido ao aumento dos espaços liquóricos fronto-temporais, enquanto apenas três pacientes apresentaram anomalias neurológicas, como encefalite-símile no primeiro ano de vida. O exame laboratorial bioquímico, a tomografia computadorizada ou a ressonância nuclear magnética são algumas das ferramentas para o diagnóstico da acidúria glutárica.

Acidúria glutárica do tipo II
Por outro lado, a acidúria glutárica do tipo II é caracterizada por um distúrbio na oxidação dos ácidos graxos, provocado pela deficiência das subunidades alfa ou beta da flavoproteína transportadora de elétrons, ou da flavoproteína transportadora de elétrons desidrogenase. É uma doença autossômica recessiva hereditária e apresenta quadros clínicos bastante variados. Cada defeito pode levar a uma variedade de casos suaves ou graves, de acordo com a localização e natureza da lesão intragênica. As características dos portadores dessa doença permitem dividi-los em três classes: uma de período neonatal com anomalias congênitas, outra de período neonatal sem anomalias congênitas e uma forma de início tardio. As classes neonatais são normalmente fatais e caracterizadas por hipoglicemia grave, acidose metabólica e envolvimento de vários sistemas, dentre outros. Por outro lado, a classe de início tardio apresenta sintomas e idade altamente variáveis ​​e se caracteriza por episódios recorrentes de letargia, vômitos, hipoglicemia, acidose metabólica e hepatomegalia.

Desordens relacionadas com a visão

Deficiência de ornitina--aminotransferase
A deficiência de ornitina--aminotransferase caracteriza uma patologia hereditária que resulta em maior concentração de ornitina e no comprometimento coriorretiniano, levando a atrofia da coroide da retina. A ornitina--aminotransferase é uma enzima nuclear, sintetizada na matriz mitocondrial, a qual possui a capacidade de catalisar a interconversão reversível da ornitina e do -cetoglutarato em glutamato semialdeído e glutamato. Estudos indicam que esta enzima é regulada por expressão gênica nos tecidos do rim e do fígado, e a sua inativação pode ser feita pela administração de uma pequena dose de 5-fluorometilornitina, o que proporciona proteção aos estados de hiperamonemia.

Albinismo óculo-cutâneo clássico
Outra patologia relacionada a visão é o albinismo óculo-cutâneo clássico, uma doença hereditária autossômica recessiva que está relacionada com a pigmentação. A causa dessa enfermidade se deve a mutações no gene que codifica a proteína P, responsável por tornar o ambiente intracelular dos melanossomos neutro para que a enzima tirosinase atue sobre a tirosina convertendo-a em DOPA e, posteriormente, em uma das formas de melanina, a feomelamina ou a eumelamina. Nos portadores do albinismo óculo-cutâneo clássico, a proteína P acidifica o meio dificultando a ação da tirosinase e, consequentemente, a produção de melanina. Indivíduos com albinismo óculo-cutâneo tirosinase negativo possuem a pele, os olhos e os cabelos sem pigmentos. Por outro lado, no albinismo óculo-cutâneo tirosinase positivo, o tipo mais frequente dentre os tipos de manifestações dessa doença, bem como o mais brando, o indivíduo afetado possui níveis variáveis de melanina em seu organismo. A diferenciação dos tipos 1 e 2 pode ser feita através do teste do bulbo capilar. No entanto, pelo fato deste teste apresentar resultados falsos (positivo e negativo), outros testes são necessários para se obter um diagnóstico preciso.

Desordens de rara incidência

Alcaptonúria
A alcaptonúria é uma doença hereditária autossômica recessiva e é provocada pela diminuição da atividade da enzima homogentisato-1,2-dioxigenase, uma enzima envolvida na metabolização dos aminoácidos fenilalanina e tirosina, e que catalisa a transformação do ácido homogentísico em ácido 4-maleil-acetoacetato. A deficiência desta enzima causa o acúmulo de ácido homogentísico no organismo, caracterizando a alcaptonúria. As principais consequências desse acúmulo são urina e cerume enegrecidos, artropatia ocronótica, e alterações renais, cardiovasculares, na uretra e na próstata, entre as menos frequentes. A alcaptonúria é uma doença de baixa prevalência (1:250.000) em grande parte dos grupos étnicos, tendo a Eslováquia uma incidência relativamente alta e raros dados no Brasil. O diagnóstico inicial na urina é feito pela detecção da alteração da cor da amostra quando exposta à luz e pela presença do ácido homogentísico por cromatografia.

Deficiência da metionina-adenosiltransferase
Outra doença enzimática de rara incidência é a deficiência da enzima metionina-adenosiltransferase. A reação catalisada por esta enzima produz S-adenosilmetionina e ATP a partir da metionina. Esta enzima participa dos processos de transmetilação, biossíntese de poliaminas e transsulfuração. A sua deficiência ocorre por mutações no gene MAT1A, que podem ser herdadas como um caráter dominante ou recessivo, dependendo de como ocorreram essas mutações, sendo que os indivíduos acometidos, geralmente apresentam-se clinicamente bem, visto que as mutações no gene são frequentemente parciais, apesar da hipermetioninemia persistente levar também ao mau hálito invulgar ou à desmielinização neural. A carência de S-adenosilmetionina pode ser compensada com tratamentos a base de suplementação com a própria substância, e a hipermetioninemia pela restrição terapêutica de metionina. O diagnóstico atualmente se baseia na detecção da hipermetioninemia e na análise molecular visando determinar o grau de mutação para futuras indicações terapêuticas contra possíveis lesões neurológicas.

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