Desordens
manifestadas nos primeiros anos de vida
Fenilcetonúria
A
fenilcetonúria é manifestada precocemente e é uma doença relacionada com os
erros congênitos do metabolismo de aminoácidos, caracterizando-se pela
deficiência da enzima fenilalanina-hidroxilase, que catalisa a conversão de
fenilalanina em tirosina, causando o acúmulo da fenilalanina e de seus
derivados no organismo. Esta doença pode causar complicações neurológicas,
sendo o retardo mental a manifestação mais grave, além de eczema, e deficiência
na pigmentação dos cabelos e da pele. A fenilcetonúria ocorre em todas as
etnias, com incidência em recém-nascidos podendo variar de 1:2.600 a 1:26.000,
sendo que no Brasil a incidência média é de 1:10.000 recém-nascidos. O
diagnóstico da fenilcetonúria é feito através de exames laboratoriais, como o
teste de Guthrie-BIA e o de McCaman e Robins efetuados num período de 24 horas
até sete dias após o parto. Quando diagnosticado, o recém-nascido é submetido a
uma dieta hipoproteica com restrição de fenilalanina, visando impedir a
manifestação dos sintomas da doença.
Acidúria glutárica do tipo I
A
acidúria glutárica do tipo I também tem manifestações nas primeiras fases da
vida, tipicamente em crianças, e na frequência de 1:30.000 indivíduos,
especialmente nos sul africanos negros. Essa doença é autossômica recessiva e é
caracterizada por uma deficiência na enzima multifuncional
glutaril-CoA-oxidase, que participa da oxidação do glutaril-CoA para a formação
de crotonil-CoA, impossibilitando a degradação da lisina e do triptofano na
mitocôndria do indivíduo acometido. A variabilidade de sintomas relacionados
com a acidúria glutárica do tipo I é atribuída a fatores epigenéticos e ao meio
ambiente, e a relação entre o grau de deficiência da enzima e o quadro clínico
ainda é desconhecida. Alguns casos foram relatados clinicamente e, dentre eles,
cita-se o de Knerr et al. que reportaram o estudo de três crianças afetadas e
que apresentavam altos níveis de ácido glutárico na urina, e o de Casella et
al. que avaliaram seis pacientes diagnosticados com a doença, todos com
macrocrania devido ao aumento dos espaços liquóricos fronto-temporais, enquanto
apenas três pacientes apresentaram anomalias neurológicas, como
encefalite-símile no primeiro ano de vida. O exame laboratorial bioquímico, a
tomografia computadorizada ou a ressonância nuclear magnética são algumas das
ferramentas para o diagnóstico da acidúria glutárica.
Acidúria glutárica do tipo II
Por outro
lado, a acidúria glutárica do tipo II é caracterizada por um distúrbio na
oxidação dos ácidos graxos, provocado pela deficiência das subunidades alfa ou
beta da flavoproteína transportadora de elétrons, ou da flavoproteína
transportadora de elétrons desidrogenase. É uma doença autossômica recessiva
hereditária e apresenta quadros clínicos bastante variados. Cada defeito pode
levar a uma variedade de casos suaves ou graves, de acordo com a localização e
natureza da lesão intragênica. As características dos portadores dessa doença
permitem dividi-los em três classes: uma de período neonatal com anomalias
congênitas, outra de período neonatal sem anomalias congênitas e uma forma de
início tardio. As classes neonatais são normalmente fatais e caracterizadas por
hipoglicemia grave, acidose metabólica e envolvimento de vários sistemas,
dentre outros. Por outro lado, a classe de início tardio apresenta sintomas e
idade altamente variáveis e se caracteriza por episódios recorrentes de
letargia, vômitos, hipoglicemia, acidose metabólica e hepatomegalia.
Desordens
relacionadas com a visão
Deficiência de ornitina--aminotransferase
A
deficiência de ornitina--aminotransferase caracteriza uma patologia hereditária
que resulta em maior concentração de ornitina e no comprometimento
coriorretiniano, levando a atrofia da coroide da retina. A
ornitina--aminotransferase é uma enzima nuclear, sintetizada na matriz
mitocondrial, a qual possui a capacidade de catalisar a interconversão
reversível da ornitina e do -cetoglutarato em glutamato semialdeído e
glutamato. Estudos indicam que esta enzima é regulada por expressão gênica nos
tecidos do rim e do fígado, e a sua inativação pode ser feita pela administração
de uma pequena dose de 5-fluorometilornitina, o que proporciona proteção aos
estados de hiperamonemia.
Albinismo óculo-cutâneo clássico
Outra
patologia relacionada a visão é o albinismo óculo-cutâneo clássico, uma doença
hereditária autossômica recessiva que está relacionada com a pigmentação. A
causa dessa enfermidade se deve a mutações no gene que codifica a proteína P,
responsável por tornar o ambiente intracelular dos melanossomos neutro para que
a enzima tirosinase atue sobre a tirosina convertendo-a em DOPA e,
posteriormente, em uma das formas de melanina, a feomelamina ou a eumelamina.
Nos portadores do albinismo óculo-cutâneo clássico, a proteína P acidifica o
meio dificultando a ação da tirosinase e, consequentemente, a produção de
melanina. Indivíduos com albinismo óculo-cutâneo tirosinase negativo possuem a
pele, os olhos e os cabelos sem pigmentos. Por outro lado, no albinismo
óculo-cutâneo tirosinase positivo, o tipo mais frequente dentre os tipos de
manifestações dessa doença, bem como o mais brando, o indivíduo afetado possui
níveis variáveis de melanina em seu organismo. A diferenciação dos tipos 1 e 2
pode ser feita através do teste do bulbo capilar. No entanto, pelo fato deste
teste apresentar resultados falsos (positivo e negativo), outros testes são
necessários para se obter um diagnóstico preciso.
Desordens
de rara incidência
Alcaptonúria
A
alcaptonúria é uma doença hereditária autossômica recessiva e é provocada pela
diminuição da atividade da enzima homogentisato-1,2-dioxigenase, uma enzima
envolvida na metabolização dos aminoácidos fenilalanina e tirosina, e que
catalisa a transformação do ácido homogentísico em ácido 4-maleil-acetoacetato.
A deficiência desta enzima causa o acúmulo de ácido homogentísico no organismo,
caracterizando a alcaptonúria. As principais consequências desse acúmulo são
urina e cerume enegrecidos, artropatia ocronótica, e alterações renais,
cardiovasculares, na uretra e na próstata, entre as menos frequentes. A
alcaptonúria é uma doença de baixa prevalência (1:250.000) em grande parte dos
grupos étnicos, tendo a Eslováquia uma incidência relativamente alta e raros
dados no Brasil. O diagnóstico inicial na urina é feito pela detecção da
alteração da cor da amostra quando exposta à luz e pela presença do ácido
homogentísico por cromatografia.
Deficiência da metionina-adenosiltransferase
Outra
doença enzimática de rara incidência é a deficiência da enzima
metionina-adenosiltransferase. A reação catalisada por esta enzima produz
S-adenosilmetionina e ATP a partir da metionina. Esta enzima participa dos
processos de transmetilação, biossíntese de poliaminas e transsulfuração. A sua
deficiência ocorre por mutações no gene MAT1A, que podem ser herdadas como um
caráter dominante ou recessivo, dependendo de como ocorreram essas mutações,
sendo que os indivíduos acometidos, geralmente apresentam-se clinicamente bem,
visto que as mutações no gene são frequentemente parciais, apesar da
hipermetioninemia persistente levar também ao mau hálito invulgar ou à
desmielinização neural. A carência de S-adenosilmetionina pode ser compensada
com tratamentos a base de suplementação com a própria substância, e a
hipermetioninemia pela restrição terapêutica de metionina. O diagnóstico
atualmente se baseia na detecção da hipermetioninemia e na análise molecular
visando determinar o grau de mutação para futuras indicações terapêuticas
contra possíveis lesões neurológicas.
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