quarta-feira, 24 de julho de 2013

Defeitos genéticos do ciclo da ureia podem ser fatais

Pessoas com defeitos genéticos em qualquer das enzimas envolvidas na formação de ureia não toleram dietas ricas em proteína. Os aminoácidos ingeridos em excesso, além das necessidades mínimas diárias para a síntese proteica, são desaminados no fígado, produzindo a amônia livre, que não pode ser convertida em ureia para ser exportada para a corrente sanguínea. E a amônia é altamente tóxica. A ausência de uma enzima do ciclo da ureia pode resultar em hiperamonemia ou no aumento de um ou mais intermediários do ciclo da ureia, dependendo da enzima que está faltando. 

Uma vez que a maioria das etapas do ciclo da ureia é irreversível, a ausência de uma atividade enzimática frequentemente pode ser identificada pela determinação de qual intermediário do ciclo está presente em concentrações especialmente altas no sangue e/ou na urina. Embora a degradação dos aminoácidos possa apresentar sérios problemas para a saúde das pessoas com deficiências no clico da ureia, uma dieta desprovida de proteínas não é uma opção de tratamento. Humanos são incapazes de sintetizar metade dos vinte aminoácidos proteicos, e esses aminoácidos essenciais devem estar presentes na dieta. Os aminoácidos essenciais são: fenilalanina, histidina, isoleucina, leucina, lisina, metionina, treonina, triptofano e valina.

Uma variedade de tratamentos é disponibilizada para pessoas com defeitos no ciclo da ureia. A administração cuidadosa na dieta dos ácidos aromáticos benzoato ou fenilbutirato pode ajudar a diminuir os níveis de amônia no sangue. O benzoato é convertido em benzoil-CoA, que se combina com a glicina, formando hipurato. A glicina utilizada nessa reação deve ser regenerada, e a amônia é captada pela reação da glicina-sintase. O fenilbutirato é convertido em fenilacetato pela beta-oxidação. O fenilacetato é então convertido em fenilacetil-CoA, que se combina com a glutamina, formando fenilacetilglutamina. A resultante remoção de glutamina desencadeia um aumento em sua síntese pela glutamina-sintetase, em uma reação que capta amônia. Tanto o hipurato quanto a fenilacetilglutamina são compostos não tóxicos e são excretados na urina.

Referência:
Princípios de Bioquímica de Lehninger

sábado, 20 de julho de 2013

Enzimas estrutura e função

As enzimas são proteínas especializadas que catalisam as reações biológicas mantendo o equilíbrio da reação, após as reações essas enzimas não são perdidas, podem atuar em diferentes condições de temperatura e pH sendo especificas ao seu substrato. Pode-se dizer que, praticamente todas as reações que ocorrem em uma célula requerem uma ação enzimática, pois elas aumentam a velocidade das reações, fazendo com que ocorra em muito menos tempo do que em condições normais. Portanto, nem todos os catalisadores biológicos são enzimas, existem também os RNAs com funções catalíticas, que participam do processamento de íntrons e RNAt, enquanto outros participam de etapas de auto-processamento por hidrólise de uma ligação fosfodiester em sua própria cadeia polipeptídica.

As enzimas podem ser classificadas em 6 classes, definidas pela reação química que catalisam; como:  
  • Classe 1: Óxido-redutases -  catalisam reações de oxidação-redução, sendo que oxidação significa a perda de elétrons e redução significa a adição de elétrons.
  • Classe 2: Transferases - são enzimas que transferem um grupo químico  de uma molécula para outra; portanto têm dois substratos e produzem dois produtos.
  • Classe 3: Hidrolases – catalisam reações de hidrólise, que é a adição de água a uma ligação química, sendo uma reação essencialmente irreversível.
  • Classe 4: Liases – essas enzimas implicam na quebra, geralmente catalisam a clivagem de ligação carbono-carbono.
  • Classe 5: Isomerases – essas enzimas estão envolvidas com o movimento de um grupo ou de uma dupla ligação dentro de uma mesma molécula, que pode incluir a troca de posição de uma hidroxila ou de uma carbonila.
  • Classe 6: Ligases – unem átomos de carbonos, mas requerem energia para a realização da reação, geralmente esta energia vem do envolvimento do ATP.
 As enzimas necessitam de uma temperatura ideal para desempenharem suas funções, essa temperatura geralmente é em torno de 36°C, a temperatura do corpo. Na sua temperatura ideal as enzimas irá catalisar uma reação com sua velocidade ao máximo, sendo que ao diminuir sua temperatura ela diminui a velocidade da reação e se aumentada acima da temperatura ideal, ela terá uma queda brusca na velocidade podendo a enzima ser desnaturada, o mesmo ocorre com as enzimas em níveis altos de pH, porém ela não tem uma queda brusca na reação, ela cai gradativamente e não desnatura a enzima, porém sua conformação é mudada de forma que a enzima não catalise mais reações.

Para melhor desempenho de suas funções as enzimas podem ser reguladas, ou seja, controlar a sua ação, seja por: alosterismo, ligação covalente ou por zimogênio. Por alosterismo a enzima tem a capacidade de mudar sua conformação e aumentar sua afinidade pelo substrato. Por ligação covalente, a enzima é regulada podendo ser adicionado um grupo fosfato (fosforilação) ou pela retirada de um grupo fosfato (desfosforilação) deixando a enzima ativa ou inativa, realizando ou não suas funções. E o controle por zimogênio as enzimas são sempre sintetizadas na forma inativa, contendo uma sequência de aminoácidos que a deixa inativa e quando esses aminoácidos são retirados, a enzima se torna ativa exercendo suas funções.

Enzimas no diagnóstico clínico

Instabilidade térmica da glicose-6-fosfato desidrogenase resulta em anemia hemolítica
Em eritrócitos, a glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PD) é uma enzima importante para a maturação da integração da membrana; uma deficiência ou inatividade dessa enzima leva a uma anemia hemolítica. Em outros casos está presente uma enzima variante, que normalmente tem atividade suficiente para manter a membrana, mas ela pode falhar em condições de estresse oxidativo. Essa condição de instabilidade térmica é especialmente crítica para os eritrócitos, uma vez que são desprovidos da capacidade de sintetizar proteínas, e não pode renovar enzimas quando se desnaturam, o resultado final é um tempo de vida muito diminuído para esses eritrócitos que tem G6PD instável estando os mesmos suscetíveis à hemólise induzidos por drogas, causando a anemia pela diminuição dos eritrócitos.

Referências
Bioquímica Ilustrada – Richar A. Harver ; Denise R. Ferrier – 5° ed – editora Artmed.
Manual de Bioquímica com correlações clínicas – Thomas M. Devlin – 7° ed – editora Blucher.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

Algumas desordens do metabolismo de aminoácidos e intermediários do ciclo da ureia

Desordens manifestadas nos primeiros anos de vida

Fenilcetonúria
A fenilcetonúria é manifestada precocemente e é uma doença relacionada com os erros congênitos do metabolismo de aminoácidos, caracterizando-se pela deficiência da enzima fenilalanina-hidroxilase, que catalisa a conversão de fenilalanina em tirosina, causando o acúmulo da fenilalanina e de seus derivados no organismo. Esta doença pode causar complicações neurológicas, sendo o retardo mental a manifestação mais grave, além de eczema, e deficiência na pigmentação dos cabelos e da pele. A fenilcetonúria ocorre em todas as etnias, com incidência em recém-nascidos podendo variar de 1:2.600 a 1:26.000, sendo que no Brasil a incidência média é de 1:10.000 recém-nascidos. O diagnóstico da fenilcetonúria é feito através de exames laboratoriais, como o teste de Guthrie-BIA e o de McCaman e Robins efetuados num período de 24 horas até sete dias após o parto. Quando diagnosticado, o recém-nascido é submetido a uma dieta hipoproteica com restrição de fenilalanina, visando impedir a manifestação dos sintomas da doença.

Acidúria glutárica do tipo I
A acidúria glutárica do tipo I também tem manifestações nas primeiras fases da vida, tipicamente em crianças, e na frequência de 1:30.000 indivíduos, especialmente nos sul africanos negros. Essa doença é autossômica recessiva e é caracterizada por uma deficiência na enzima multifuncional glutaril-CoA-oxidase, que participa da oxidação do glutaril-CoA para a formação de crotonil-CoA, impossibilitando a degradação da lisina e do triptofano na mitocôndria do indivíduo acometido. A variabilidade de sintomas relacionados com a acidúria glutárica do tipo I é atribuída a fatores epigenéticos e ao meio ambiente, e a relação entre o grau de deficiência da enzima e o quadro clínico ainda é desconhecida. Alguns casos foram relatados clinicamente e, dentre eles, cita-se o de Knerr et al. que reportaram o estudo de três crianças afetadas e que apresentavam altos níveis de ácido glutárico na urina, e o de Casella et al. que avaliaram seis pacientes diagnosticados com a doença, todos com macrocrania devido ao aumento dos espaços liquóricos fronto-temporais, enquanto apenas três pacientes apresentaram anomalias neurológicas, como encefalite-símile no primeiro ano de vida. O exame laboratorial bioquímico, a tomografia computadorizada ou a ressonância nuclear magnética são algumas das ferramentas para o diagnóstico da acidúria glutárica.

Acidúria glutárica do tipo II
Por outro lado, a acidúria glutárica do tipo II é caracterizada por um distúrbio na oxidação dos ácidos graxos, provocado pela deficiência das subunidades alfa ou beta da flavoproteína transportadora de elétrons, ou da flavoproteína transportadora de elétrons desidrogenase. É uma doença autossômica recessiva hereditária e apresenta quadros clínicos bastante variados. Cada defeito pode levar a uma variedade de casos suaves ou graves, de acordo com a localização e natureza da lesão intragênica. As características dos portadores dessa doença permitem dividi-los em três classes: uma de período neonatal com anomalias congênitas, outra de período neonatal sem anomalias congênitas e uma forma de início tardio. As classes neonatais são normalmente fatais e caracterizadas por hipoglicemia grave, acidose metabólica e envolvimento de vários sistemas, dentre outros. Por outro lado, a classe de início tardio apresenta sintomas e idade altamente variáveis ​​e se caracteriza por episódios recorrentes de letargia, vômitos, hipoglicemia, acidose metabólica e hepatomegalia.

Desordens relacionadas com a visão

Deficiência de ornitina--aminotransferase
A deficiência de ornitina--aminotransferase caracteriza uma patologia hereditária que resulta em maior concentração de ornitina e no comprometimento coriorretiniano, levando a atrofia da coroide da retina. A ornitina--aminotransferase é uma enzima nuclear, sintetizada na matriz mitocondrial, a qual possui a capacidade de catalisar a interconversão reversível da ornitina e do -cetoglutarato em glutamato semialdeído e glutamato. Estudos indicam que esta enzima é regulada por expressão gênica nos tecidos do rim e do fígado, e a sua inativação pode ser feita pela administração de uma pequena dose de 5-fluorometilornitina, o que proporciona proteção aos estados de hiperamonemia.

Albinismo óculo-cutâneo clássico
Outra patologia relacionada a visão é o albinismo óculo-cutâneo clássico, uma doença hereditária autossômica recessiva que está relacionada com a pigmentação. A causa dessa enfermidade se deve a mutações no gene que codifica a proteína P, responsável por tornar o ambiente intracelular dos melanossomos neutro para que a enzima tirosinase atue sobre a tirosina convertendo-a em DOPA e, posteriormente, em uma das formas de melanina, a feomelamina ou a eumelamina. Nos portadores do albinismo óculo-cutâneo clássico, a proteína P acidifica o meio dificultando a ação da tirosinase e, consequentemente, a produção de melanina. Indivíduos com albinismo óculo-cutâneo tirosinase negativo possuem a pele, os olhos e os cabelos sem pigmentos. Por outro lado, no albinismo óculo-cutâneo tirosinase positivo, o tipo mais frequente dentre os tipos de manifestações dessa doença, bem como o mais brando, o indivíduo afetado possui níveis variáveis de melanina em seu organismo. A diferenciação dos tipos 1 e 2 pode ser feita através do teste do bulbo capilar. No entanto, pelo fato deste teste apresentar resultados falsos (positivo e negativo), outros testes são necessários para se obter um diagnóstico preciso.

Desordens de rara incidência

Alcaptonúria
A alcaptonúria é uma doença hereditária autossômica recessiva e é provocada pela diminuição da atividade da enzima homogentisato-1,2-dioxigenase, uma enzima envolvida na metabolização dos aminoácidos fenilalanina e tirosina, e que catalisa a transformação do ácido homogentísico em ácido 4-maleil-acetoacetato. A deficiência desta enzima causa o acúmulo de ácido homogentísico no organismo, caracterizando a alcaptonúria. As principais consequências desse acúmulo são urina e cerume enegrecidos, artropatia ocronótica, e alterações renais, cardiovasculares, na uretra e na próstata, entre as menos frequentes. A alcaptonúria é uma doença de baixa prevalência (1:250.000) em grande parte dos grupos étnicos, tendo a Eslováquia uma incidência relativamente alta e raros dados no Brasil. O diagnóstico inicial na urina é feito pela detecção da alteração da cor da amostra quando exposta à luz e pela presença do ácido homogentísico por cromatografia.

Deficiência da metionina-adenosiltransferase
Outra doença enzimática de rara incidência é a deficiência da enzima metionina-adenosiltransferase. A reação catalisada por esta enzima produz S-adenosilmetionina e ATP a partir da metionina. Esta enzima participa dos processos de transmetilação, biossíntese de poliaminas e transsulfuração. A sua deficiência ocorre por mutações no gene MAT1A, que podem ser herdadas como um caráter dominante ou recessivo, dependendo de como ocorreram essas mutações, sendo que os indivíduos acometidos, geralmente apresentam-se clinicamente bem, visto que as mutações no gene são frequentemente parciais, apesar da hipermetioninemia persistente levar também ao mau hálito invulgar ou à desmielinização neural. A carência de S-adenosilmetionina pode ser compensada com tratamentos a base de suplementação com a própria substância, e a hipermetioninemia pela restrição terapêutica de metionina. O diagnóstico atualmente se baseia na detecção da hipermetioninemia e na análise molecular visando determinar o grau de mutação para futuras indicações terapêuticas contra possíveis lesões neurológicas.

Referências
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   Mira NVM, Marquez UML. Importância do diagnóstico e tratamento da fenilcetonúria. Revista de Saúde Pública. 2000;34(1):86-96.
   Martins FF, Mendes AB, Cruz WMS, Boaventura GT. Metabolismo do cálcio na fenilcetonúria. Revista de Nutrição. 2009;22(3):419-28.
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   Van der Watt G, Owen EP, Berman P, Meldau S, Watermeyer N, Olpin SE, et al. Glutaric aciduria type 1 in South Africa-high incidence of glutaryl-CoA dehydrogenase deficiency in black South Africans. Mol Genet Metab. 2010 Oct-Nov;101(2-3):178-82.
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   Casella EB, Bresolin AU, Valente M, Daniel DA, Machado JJ, Vieira MA, et al. Acidúria glutárica tipo 1: variabilidade fenotípica. Estudo de seis pacientes. Arquivos de Neuro-Psiquiatria. 1998;56(3-B):545-52.
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  Fagan RJ, Sheffield WP, Rozen R. Regulation of ornithine aminotransferase in retinoblastomas. J Biol Chem. 1989 Dec 5;264(34):20513-7.
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   Nesterova G, Gahl WA. Cystinosis: the evolution of a treatable disease. Pediatr Nephrol. 2013 Jan;28(1):51-9.
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sexta-feira, 12 de julho de 2013

Ácidos graxos poliinsaturados ômega-3 e ômega-6: importância e ocorrência em alimentos

Ácidos graxos ômega-3 (n-3) e ômega-6 (n-6) são aqueles que apresentam insaturações separadas por apenas um carbono metilênico, em que a primeira instauração se encontra na posição 3 ou na posição 6, definindo o número do ômega. É importante lembrar que a enumeração desses ácidos graxos se inicia a partir do grupo metil terminal, ou seja, inversa a enumeração a partir da carboxila.
Ácidos graxos do tipo ômega de cadeia muito longa são de vital importância para a estrutura e função do cérebro e da retina. Alguns deles são o ácido docosahexaenóico (ADH) e o ácido docosapentaenóico (ADP) que são produzidos no retículo endoplasmático de células hepáticas (por meio de alongases, Δ-dessaturases e β-oxidação) a partir dos ácidos linoleico (AL) e alfa-linolênico (AAL)-obtidos pela dieta. Outro ácido graxo de vital importância produzido até mesmo por bebês prematuros, caso ocorra a ativação das Δ-dessaturases, é o ácido araquidônico (AA).
O ADH é importante para a transdução da luz na retina, pois se liga a fosfolipídeos associados a rodopsina, proteína que interage no processo de absorção da luz. O ADH também influencia na manutenção das membranas e receptores cerebrais, prevenindo algumas doenças neuro-degenerativas. Apesar do AA se apresentar em menor concentração que o ADH, ele é de extrema importância no funcionamento dos neurônios.
A razão entre os ácidos graxos n-3 e n-6 de uma população são usados como indicativo de sua qualidade alimentar. Faz-se necessário diminuir essa razão, pois altos valores estão relacionados com doenças cardiovasculares. Por outro lado, o valor deve se manter acima de 1:1 para que não ocorra a inibição da transformação de AL em ácidos graxos de cadeia muito longa.
As hortaliças de coloração verde escura são exemplos de alimentos que apresentam alta concentração de AAL, assim como peixes, aves, arroz, feijão, soja, ervilha, aveia e linhaça.

Referência
MARTIN, Clayton Antunes et al.Ácidos graxos poliinsaturados ômega-3 e ômega-6: importância e ocorrência em alimentos. Rev. Nutr. 2006, vol.19, n.6, pp. 761-770. ISSN 1415-5273.